Há meses tive oportunidade de assistir a uma palestra que discutia o enquadramento jurídico da inteligência artificial. Foi defendida a necessidade, e a pressa, de debater e escolher um enquadramento jurídico adequado às actividades de entidades artificiais inteligentes.
Tomava-se como partida que, num futuro próximo, irão surgir entidades com inteligência artificial (EIA) capazes de raciocínios autónomos; as primeiras formas serão constituídas por entidades de software que tomarão decisões autónomas, porventura capazes de negociar com outras EIA; as decisões tomadas terão implicações passíveis de serem litigadas.
Como exemplos apontava-se a exequibilidade de uma EIA a decidir divórcios de acordo com lei e com os requisitos de partilha dos divorciantes; apontava-se também a proximidade de obter uma EIA que tomasse decisões médicas ou recomendasse médicos no seu exercício; e ainda, um cenário de várias EIA a negociar entre elas títulos e acções bolsistas.
Confesso que na altura não entendi nem reconheci a necessidade apresentada. A atenção que despendi também não foi a melhor, tanto que acabei por ficar sem saber o nome do principal apresentador - o que, admito, é uma negligência da minha parte, da qual sou o grande perdedor. Em meu abono, e pelo que encontrei há dias no 4R, num post de JMFA, o debate sobre o uso de sistemas de apoio à decisão na justiça ainda não assentou e o exemplo mais imediato das EIA é a decisão de casos simples na justiça. Curiosamente o post de JMFA é titulado: Juiz ou Autómato?.
Recordo-me de ser sugerida a possibilidade de criar um novo tipo de personalidade jurídica - um conceito que, na minha grande ignorância legal, só conhecia dos sketches dos Gato Fedorento.
Só há pouco tempo, quando vagueava noutros assuntos, é que percebi a palestra. Estava a ouvir alguém a falar da justiça de os investidores usufruírem inteiramente dos lucros obtidos, porque foram aqueles que assumiram os riscos e os custos do investimento.
A estranheza com que recebi o que me estava a ser dado na palestra resulta de assumir um principio simples - que na altura me aparecia óbvio - quem constrói, sustenta e lucra com a EIA é que será responsável pelas consequências das suas acções.
Desconsiderando as tecnicalidades de definir o constrói, sustenta e lucra, parece um critério fácil, transparente, justo e pouco ambíguo. Não é?
Mas não vivemos num mundo assim.
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